Momentum Metaxis: Entrevista ao Arqui-Druida da Lvsitânea
Metaxis: Estimado /|\ Adgnatios, Grande Druida da Lvsitânea, como sabe, o meu nome é Màthair Sorchae, Marcassin da Assembleia da Tradição Druídica Lusitana (ATDL), e agradeço-lhe desde já a disponibilidade para a realização desta entrevista para a Reportagem Metaxis, que será publicada no 2º número da Revista da Tradição Lvsitana, referente ao 1º semestre de 2017, e dedicado ao tema A Espiritualidade Atlântica. Vivenciamos um momento importante e feliz para a nossa Tradição, ao ter sido recentemente criado o Centro Druídico da Lvsitânea, razão para esta nossa entrevista, pelo que gostaria de lhe colocar as seguintes questões:
Metaxis: Como surgiu a ideia de criar o Centro Druídico da Lvsitânea (CDL)?
Arqui-Druida /|\ Adgnatios: Antes de mais, Màthair Sorchae, é com enorme satisfação que recebo a «Reportagem Metaxis» da Revista da Tradição Lvsitana em minha casa; receba os meus mais profundos cumprimentos para toda a equipa, em geral, e a si, em particular, felicito-a pela excelente entrevista, que fará em breve um ano, ao Druida da Lutécia no lançamento do nº 0 da Revista da Tradição Lvsitana. Na verdade, a ATDL recebeu recentemente do Duty Guardian da Celtic Druid Alliance (CDA), o Druida /|\ Con Connor, a informação de que o próximo encontro da CDA, em 2019, iria ser realizado em Portugal, sendo que a nossa Assembleia teria sido designada como a anfitriã deste importante evento. Colocámos então a necessária questão: de que modo é que nós poderíamos receber de forma digna as nossas irmãs e irmãos de todo o mundo celta? – Não irei responder à questão por mim colocada, mas deixo a título de informação que, após apurarmos o custo que teria só o aluguer de um espaço para esse efeito, foi esse o primeiro momento em que a ATDL pensou em adquirir um terreno que nos proporcionasse condições para a realização do evento em questão. No entanto, dadas as condições naturais do espaço, outras possibilidades começaram-se a desenhar e rapidamente a ganhar sentido: erguer o CDL, entre outras coisas mais… muito mais, que serão realizadas a seu tempo.
Metaxis: Pois, talvez seja sobre essas coisas «mais» que a Metaxis quer saber um pouco mais, caro Druida. A Metaxis sabe que o local escolhido não foi ao acaso. Porque razão foi eleito o Alentejo, mais concretamente o Corval, perto de Reguengos de Monsaraz?
Arqui-Druida /|\ Adgnatios: Trata-se de uma região pejada de maravilhosos monumentos megalíticos. Que melhor local para implantar o nosso Centro Druídico do que numa região onde certamente os nossos ancestrais desenvolveram a sua atividade Espiritual? Pois bem, dada a escassez de recursos de que padece a ATDL, uma vez que esta Assembleia Céltica Druídica é uma estrutura humilde em todos os aspectos, pois logisticamente apenas sobrevive graças à boa vontade de muitos dos seus membros, escolhemos com o maior critério possível e fomos abençoados pelas Deusas e pelos Deuses da Lvsitânea Céltica: o espaço que desejávamos, mesmo que dispuséssemos de outras condições, estava perfeitamente ao alcance das nossas possibilidades, e assim foi, conseguimos, não sem antes termos de lidar com os contratempos próprios à realização de um sonho, que era o nosso. As correntes telúricas que atravessam o CDL informam-nos de que talvez tenhamos sido nós os escolhidos e não aqueles que escolheram. Se fizermos uma triangulação energética, constatamos que o espaço onde se encontra agora implantado o CDL recebe Fluxo Espiritual não só de um enorme conjunto de monumentos antigos, bem como aponta a uma profunda conexão cardeal. Não deixando de referir o importante facto de que foi naquela região que também habitaram os Célticos da Lvsitânea. Enfim, mais razões houvesse e de certeza que seria aquele o espaço, no coração do Grande Alentejo, fronteira entre o Alto, o Baixo Alentejo e Espanha, que também nos informa de antigas Alianças com a Celtibéria.
Metaxis: O local é fértil em pedras megalíticas, ainda não manipuladas pelo Homem. Pode-nos falar um pouco sobre o projeto arqueológico de identificação das pedras e construção do Cromeleque, no terreno escolhido para o CDL, e que servirá de Nemeton para a ATDL?
Arqui-Druida /|\ Adgnatios: Também nesse sentido fomos abençoados. Costumo dizer que as pedras são as verdadeiras testemunhas “vivas” da primeira noite dos tempos, pelo que é um privilégio para nós termos a possibilidade de partilhar um espaço, que é delas, feito em torno delas, com elas. Não só continuarão lá, como irão ter a dignidade que merecem, tornando-se elementos “vivos” fundamentais na ambiência que pretendemos promover no CDL. Neste sentido, contactámos um dos maiores especialistas mundiais em megalitismo, o arqueólogo Manuel Calado, não só para nos aconselhar na sua preservação, mas também para nos orientar no modo como, sem as descaracterizar ou ao espaço, poderemos articular o nosso Múnus Espiritual e Cultural com uma certa reorganização do tecido pétreo, nomeadamente, com vista à construção do Cromeleque que fez referência, pelo que será necessário identificar aquelas que se apresentam como as mais adequadas para podermos erguer um Templo digno, que faça jus à grandeza do tecido megalítico da região e que nos permita, assim, honrar os nossos ancestrais.
Metaxis: Como encara a escassa atenção, por parte dos nossos governantes, dada a um património megalítico riquíssimo e cultural do Alentejo, nomeadamente no que diz respeito à sua preservação e divulgação?
Arqui-Druida /|\ Adgnatios: Com um sentimento de profunda tristeza. Aliás, a resposta anterior, por contraposição, demonstra que a ATDL faz precisamente aquilo que os nossos governantes deveriam deliberar para ser feito. Você já esteve comigo em Newgrange, Màthair Sorchae, e sabe perfeitamente a que me refiro. Se passássemos os olhos pelos diversos blogs acerca do megalitismo existentes em todo o mundo, perceberíamos perfeitamente que o nosso tecido megalítico é um dos mais referenciados. O turismo megalítico aos monumentos Lusitanos é feito de forma parda, os turistas vêm ao nosso país e perdem-se à procura pelos campos, o que também é bom, mas seria melhor se fosse de forma intencional, pois não têm qualquer tipo de informação ou orientação para chegar até eles e assim deles poderem fruir. Aceitaria uma exploração turística sustentada, cujos lucros revertessem para a preservação, manutenção e reabilitação de inúmeros monumentos que se encontram dispersos pelos campos, como, por exemplo, à imagem do que fazem os irlandeses com Newgrange. Quantos possíveis ‘Newgranges’ Lusitanos teremos na Portuguese Heritage, mais concretamente no Alentejo? Nem lhes sei a conta, mas sei que muitos se encontram abandonados, vandalizados e perdidos dos tempos.
Metaxis: Considera que a existência de um campus permitirá uma maior facilidade de difusão da Tradição Lusitana e a possibilidade de concretizar ensinamentos? Está prevista a criação de um espaço dedicado ao ensino da Tradição a todos aqueles que responderem ao apelo de percorrer esse caminho de Aprendizagem?
Arqui-Druida /|\ Adgnatios: O eixo da nossa Tradição é Espiritual, ou seja, ela é um corpo-agente vivo e culturalmente ativo dentro de um vasto Território Espiritual que nós designamos como Céltia. Mas, como sabemos, a nossa atividade desenvolve-se também num mundo concreto, mundo no qual devemos evoluir e em relação ao qual temos responsabilidade de contribuir para uma realização benfazeja e mais digna da consciência humana, entre outras coisas, razão pela qual este ‘corpo-agente’ precisa de um espaço de sentido para acontecer em egrégora, do seu ethos. Por isso, sim, um campus, como bem refere, que significa pagus, é um lugar-casa natural onde a ATDL poderá evoluir enquanto comunidade. E comunidade também significa desenvolver o que pertinentemente alocou: a criação de um espaço dedicado à aprendizagem e ao ensino da Tradição. Mas atenção, antes de mais ao acolhimento, pois não há ensinamento que passe se antes não abrigarmos quem nos procura. A Tradição ensina pelo exemplo das suas atitudes.
Metaxis: Que outros projetos poderá o Centro Druídico da Lvsitânea vir a acolher, nomeadamente no que diz respeito à grande Irmandade Celta da qual a ATDL faz parte e a outras comunidades?
Arqui-Druida /|\ Adgnatios: Primeiro, não obstante ser em 2019, no que respeita à Irmandade Celta, estarmos já a preparar o encontro da CDA. Também estamos em conversação com os nossos Irmãos da Galiza, IDG, e de Barcelona, a HDDA, com vista à realização de eventos conjuntos, pois a nossa casa está aberta a quem comunga dos nossos princípios fundamentais. No que respeita a outras comunidades, estão previstas algumas atividades a desenvolver em parceria com uma Universidade Sénior. Talvez criemos a Horta Sénior de Permacultura. Já é muito, pois ainda é cedo para mais, uma vez que agora precisamos de canalizar os nossos esforços para munir o CDL de condições para outros voos. O CDL ainda voa baixinho, mas já voa.
Metaxis: A Natureza como Ser Supremo. Nos tempos que correm, em que o homem perdeu o contacto com o essencial, agredindo constantemente a nossa Terra-Mãe e manifestando o ódio e a violência para com o seu próximo, acredita que será possível construir uma Comunidade baseada nos valores da Tradição e em plena consonância com a Natureza? Se sim, que papel poderia desempenhar o Centro Druídico da Lvsitânea para o seu florescimento?
Arqui-Druida /|\ Adgnatios: Como atrás referi, a Tradição ensina pelo exemplo dos seus membros, que em conjunto formam uma egrégora, grupo de caminhantes e buscadores do sentido espiritual. Deste modo, parece-me perfeitamente tangível e até expectável que, desde que a observância dos princípios e valores da Tradição não seja melindrada ou ferida, se possa criar uma comunidade de valores com vista ao bem comum Espiritual, que necessariamente teria que estar em plena consonância com a Natureza, pois ela é o Livro da Tradição, no qual consta o Verbo, o Espírito. Todos somos seres naturais, mas deixámo-nos descaracterizar. A vida no CDL deve ser uma vida pautada pelo princípio de uma dignidade espiritual comum a todos os seres, na Mãe-Terra, com ela e por ela.
Metaxis: Sabemos que tem vindo a ser desenvolvido pela ATDL um trabalho de fundo, de rigor científico, de levantamento e recriação dos elementos que dizem respeito ao povo da Lvsitânea, os rituais e identificação de elementos filosóficos e teológicos. Está disposta a ATDL a partilhar as conclusões desse enorme esforço investigativo e de que modo o Centro Druídico da Lvsitânea poderá contribuir para que esse trabalho possa ser conhecido do público em geral?
Arqui-Druida /|\ Adgnatios: Não só está disposta como já o tem feito por inúmeras Universidades em todo o país, com palestras, conferências e oficinas de estudo. Existe, de algum tempo para cá, quer em revistas de renome, quer mesmo em livros, um assinalável conjunto de artigos e textos publicados por membros da ATDL que fazem referência às nossas descobertas e conclusões extraídas do nosso labor investigativo. Ainda este ano irei dar uma conferência sobre «A experiência do Sagrado na Tradição Druídica» no local mais emblemático do cristianismo em Portugal, em Fátima. Para além de tudo o que referi, pois só estudando se ensina, o CDL não poderia deixar de ser um ‘Centro de Estudos’, não só porque não faria sentido ser de outro modo, mas, fundamentalmente, porque ‘habitam’ na ATDL muitas pessoas interessadas nesses assuntos e análogos, e cuja formação académica é conexa à nossa Tradição: Filosofia, História, Literatura e etc. O nosso novo site é também um importante veículo de partilha, pois nesta plataforma consta uma excelente oferta digital de ensaios que se podem considerar uma pequena parte de um maior acervo deste ‘Centro de Estudos’ e que, aos poucos, vamos divulgando. Em primeira mão, para a Metaxis, informo que o nosso ‘Centro de Estudos’ será chamado de «o Tabernáculo de Estudos Druídicos da Lvsitânea». E não, o termo «Tabernáculo», nada tem a ver com o ‘tabernáculo’ da tradição judaica, pois trata-se de uma terminologia mais antiga que o próprio judaísmo. A razão da escolha é simples, porque faz referência concreta a uma tenda de companheiros, em homenagem aos nossos ancestrais, para além de nos remeter para uma profunda intuição de acolhimento, uma vez que o seu radical de origem indo-europeia, *treb, significa precisamente morada. Falamos, então, da ‘casa’ de estudos da nossa Tradição.
Metaxis: Agradecemos a sua disponibilidade para a realização desta entrevista e as respostas esclarecedoras que nos forneceu, desejando os maiores sucessos para o Centro Druídico da Lvsitânea e, já agora, também em primeira mão, para o Tabernáculo de Estudos da Lvsitânea.
Arqui-Druida /|\ Adgnatios: Sou eu quem tenho o dever de agradecer pelo interesse e pelo tempo disponibilizado para o efeito. Espero que as respostas tenham correspondido à dignidade das questões.
Bem Hajam.